São Caetano pintado por Giambattista Tiepolo |
O título deste texto é o mesmo da
obra Vittoria di si stesso[1]
do frei dominicano João Batista Carioni da Crema (cerca de1460-1534)[2],
que como se sabe foi diretor espiritual de S. Caetano. O nome da obra já nos sugere muitas coisas
sobre o seu provável conteúdo, contudo, o que nos interessa não é isso
exatamente, nem a obra em si, senão o impacto da espiritualidade ou ideia que
está por trás, na pessoa de Caetano. O que vem a ser essa vitória de si mesmo?
Com certeza no acompanhamento espiritual que Carioni fez com Caetano, deve de
algum modo ter passado sua riqueza espiritual inclusive sobre essa questão.
Sobre isso um questionamento pode
se fazer presente: por que é necessário vencer-nos a nós mesmos? Primeiramente
devemos ter em conta que o objeto da batalha não é a pessoa em si apenas, mas,
sobretudo, sua vontade ou desejo. Isto é, o que se busca vencer em nós mesmos é
a nossa própria vontade, frequentemente mesquinha.
Mas para que vencer a própria
vontade? Para que possamos, com maior liberdade, admitir e realizar a Vontade Divina, é o que nos leva
de modo perfeito ao Fiat voluntas tua! [3]
Caetano herda, de certo modo,
essa espiritualidade de Carioni e a buscou vivê-la. Onde podemos, na biografia
do santo, notar esse esforço? Antonio Prato nos relata o seguinte: “... devendo partir de Veneza para a
prepositura de Nápolis, e, os outros Padres, confiando a ele [Caetano] a
eleição do companheiro, não quis nomear nenhum, ao invés disso, voltado ao
Crucifixo rezou ao Senhor que inspirasse nos corações dos Padres a dar-lhe
aquele que fosse mais contrário ao seu gosto.” [4]Temos
prova aqui do esforço do santo em busca de vencer sua própria vontade. Como diz
Santa Tereza do Menino Jesus: “...essa
pequena vitória sobre a minha vontade me custou muito...”, de fato, deve
ter custado muito a Caetano a sua vitória, mas ele nos mostra o quão é
possível.
Muito interessante poder ver, com
este exemplo, aquilo que Oliver afirma em seu livro: “Assim, pois, o método espiritual de Fr. Batista de Crema se tornou
vida e ação em Caetano de Thiene...”.[5]
Exatamente, Caetano foi fiel a sua formação espiritual, foi obediente e confiou
naquele que o instruiu. Outro aspecto importante da vitória de si mesmo é o da
obediência, pois vencendo o desejo próprio alcança-se a obediência pacífica,
todavia não é uma obediência cega e sem escrúpulos.
De fato, os inimigos mais cruéis
e difíceis somos nós mesmos. Por conta da dificuldade que temos de nos opor a
nós mesmos naquilo que queremos; ir contra o desejo próprio. Isso se dá pelo
fato de que sempre vamos ser partidários ou defensores de nossas próprias
causas, vontades. Isso nos leva a crer que estamos certos, que o queremos é o
melhor para nós. Ora se queremos fazer a vontade de Deus, implica então que a
minha vontade não é necessariamente a mesma Dele.
Portanto, para que a Vontade de
Deus seja a nossa vontade devemos, não negar a nossa, mas livremente abdicá-la,
para que a Vontade Divina tenha cada vez mais espaço em nós. Isso caracterizará
a grande vitória de nós mesmos.
Pedro G. Moreira
[1]
Obra cujo título completo e original:
Della Cognizione e vittoria di se stesso, Milão (1531).
[2] O
ano do nascimento não é exato, pode ser em algum momento entre 1450 e 1960, em
Crema, Itália.
[3]
Seja feita a vossa vontade, um dos pedidos da oração do Pater Noster.
[4]
ANDREU, Francisco, Relazione del P. D.
Giovanni Antonio Prato, Regnum Dei 1 (1945),p. 130.
[5]
OLIVER, Antonio, Os Teatinos...,
p.55.